Página de doutrina Batista Calvinista. Cremos na inspiração divina, na inerrância e infalibilidade das Escrituras Sagradas; e de que Deus se manifestou em plenitude no seu Filho Amado Jesus Cristo, nosso Senhor e Salvador, o qual é a Segunda Pessoa da Triunidade Santa

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - aula 38: A prova da Trindade - parte 1



Por Jorge Fernandes Isah


Algo que os inimigos de Deus insistem em desprezar são as evidências bíblicas. Tenho por evidências o seu significado principal: aquilo que é incontestável, que todos vêem ou podem ver e verificar  Mas esclareço também: por inimigo de Deus reputo aquele que considera bastar à amizade ser simpatizante ou pessoa que reconhece a existência divina. Qualquer um, seja qual o seu grau de tolice, pode fazê-lo. É claro que haverá sempre os tolos excessivos em sua soberba e que acreditam em sua autonomia para negá-la. Esses são os tipicamente acometidos pela tolice extrema, um caso grave de obstinação teimosa ou obstinada teimosia que, em último caso, acreditam-se eles próprios o seu único deus. Há variações em que eles são acompanhados por outros deuses, seja a ciência, a natureza ou delírios quase patológicos em que as criaturas, numa tentativa sempre frustrada, são entronizadas no trono que não lhes pertence. Conheço pessoas que desconsideram a existência de Deus, mas não se furtam a lançar a sua fé sobre et's e duendes. Para eles, é mais fácil crer em um et com uma mente iluminada que atravessou milhares e mesmo milhões de anos-luz para nos conhecer ou viver entre nós. Talvez, por isso, canais como o Discovery ou History não se casam de produzir programas sobre as muitas visitas alienígenas à Terra, numa prova inconteste da incredulidade no verdadeiro e a crença no falso. E tudo isso para eles tem um caráter científico e historiográfico, ainda que não passem de investigações teóricas, mas que, para muitos, vão além disso e se tornam em fatos, em realidade. Portanto não basta dizer que se ama a Deus, porque o amor, por mais nobre sentimento que seja, se for em relação ao objeto inexistente é um amor fictício e fantasioso, que significará apenas uma espécie de autoamor, de um amor que tem como fim último a si mesmo e não ao outrem. Posto que não passará de nada além de uma ideia acalentada e mantida pela própria mente que a criou. Insisto que inimigos são todos aqueles que rejeitam, em maior ou menor grau, o Deus bíblico. E nesse rol é possível enquadrar uma ampla gama de crentes que dizem conhecer o que não conhecem, entender o que não entendem ou pôr a fé em nada além de si mesmo e suas opiniões. Não há um aprofundamento e investigação honesta, sincera, na busca da verdade. Apenas o querer satisfazer-se mais rápida e prontamente, e gasta-se o restante do tempo em aperfeiçoar algo sem fundamento, ou melhor, fundamentado na incerteza. A esse o Senhor chamou-o insensato, pois ao invés de ouvir e cumprir as suas palavras, como o construtor que ergue a sua casa na rocha, ele as descumpri, como aquele que constrói a casa na areia [Mt 7.24-29].

Digo isso porque, em linhas gerais, os inimigos de Deus são reducionista em suas mentes racionalistas. Eles se queixam de que nós, "fundamentalistas", somos ignorantes e obtusos em nossas proposições, mas esquecem-se de olhar no espelho. Pensando-se superiores e racionais, acabam por assumir a própria inferioridade e irracionalidade. No fim-das-contas são como meninos mimados de quem se tirou o pirulito. Repetem os mesmos chavões e inconsistências; para eles, o branco da luz é apenas o branco e nada mais. Mas esquecem-se de que o branco da luz é a combinação de muitas outras cores. Na verdade eles sabem, mas fingem não saber. O mesmo se dá em relação ao Deus bíblico, eles o ignoram não porque não haja evidências, mas por não aceitá-nas. O não reconhecimento passa a ser uma obstinação insensata, fruto da tolice, mas essa é proveniente da soberba de não ter a quem responder, nem ter de responder. No fundo, há o interesse de não se ser responsável por si mesmo, ainda que aceitem, em menor grau, a responsabilidade social, em relação ao outro; o que, cada vez mais, vem sendo relativizado, onde a responsabilidade pessoal é transferida ao grupo ou coletivo.

Mas o que isso tudo tem a ver com a doutrina da Triunidade? perguntaria alguém.

O fato é que os antitrinitarianos são o exemplo de mentalidade reducionista, fruto do racionalismo. Assim como o ateísmo rejeita a Deus, e o homem, em sua condição de criatura divina, postula uma fórmula estupidificante e antinatural como o materialismo, os antitrinitarianos rejeitam a revelação do Deus Triuno para se embrenharem num simplismo bem ao estilo pagão do unitarismo. O mesmo problema acontece quando nos acusam de triteísmo, temos o reducionismo novamente. Quando dizem que o termo "Trindade" não se encontra na Bíblia, olha ele lá novamente. E se atentarmos para toda a argumentação deles, por mais elaborada que seja, por mais sofisticada que pareça, sempre estará evidente o reducionismo e o simplismo e, invariavelmente, uma boa dose de desonestidade intelectual [e muitos sequer imaginam-se assim, o que é pior]. Mas para não ficar apenas nas palavras vãs, como alguns podem sugestionar, vamos ao que interessa, a irrefutabilidade bíblica da Triunidade.

Não vou repetir aqui o que já disse outras vezes, especialmente neste estudo sobre o ser de Deus, que é o capítulo dois da CFB de 1689, mas analisar biblicamente a doutrina da Trinunidade. Pois bem, dias desses, assisti ao vídeo do pr. Paulo Romeiro no site Internautas Cristãos, do amigo Incendiário, como uma prova incontestável da doutrina da Trindade. Pois bem, à primeira vista, fiquei realmente embasbacado com a prova. Primeiro, assista o vídeo, e depois continuamos, na próxima aula.



Notas: 1- O áudio desta aula trata dos seguintes assuntos não abordados no texto: Revelaçao progressiva; a Trindade no Antigo Testamento [os nomes de Deus no plural, o anjo do Senhor, etc] e no Novo Testamento [A fórmula batismal, a bênção apostólica, etc], entre outros.
2- Aula realizada na EBD do Tabernáculo Batista Bíblico
3- O áudio desta aula pode ser baixado em Aula 38.MP3

domingo, 28 de outubro de 2012

Aula 37: Martírio: o testemunho cristão

Por Jorge Fernandes Isah

Façamos uma leitura de alguns textos bíblicos:

- Mt 5.10-16;

- Filipenses 1.27-30

- 2Tm 2.8-13

- Rm 8.17

- 2Co 1.7

Na última aula, se não me engano, eu disse que a única certeza do crente era de que ele padeceria e sofreria neste mundo. Por isso selecionei alguns trechos que espero os irmãos leiam e meditem neles durante a semana.

1) Gostaria que os irmãos pensassem no que lemos. Qual a primeira coisa que lhe veio à mente?

2) Vivemos tempos de perseguição?

3) Algum dos irmãos pode dar um exemplo prático de como é ser perseguido neste mundo?

Vejam bem, o Cristianismo bíblico sempre foi perseguido em todos os tempos. Os primeiros quatro séculos da era cristã foram de perseguição e morte para a igreja. Muitos perderam a própria vida por amor a Cristo, pois era-lhes impossível negar aquele que os amou eternamente e entregou-se a si mesmo por eles na cruz. Era-lhes preferível a morte física do que rejeitar o Salvador e Senhor e a fé. Por isso, muitos foram sacrificados, e mesmo colocados como objeto de diversão nas arenas romanas. Famílias inteiras eram presas, perdiam seus bens e eram lançadas às feras: leões e gladiadores.

Há exemplos na Bíblia, desde o sacrifício do próprio Senhor Jesus, crucificado e morto injustamente, passando por

- Estevão [At 7.54-60] [2],

- pela dispersão da igreja [At 8.1-4],

- por Tiago, irmão de João o evangelista, pelas mãos de Herodes Agripa [AT 12.2],

- a prisão de Pedro pelo mesmo Herodes Agripa [At 12.3-11].

O significado da palavra martírio: Gr. martýrion, testemunho.

Comumente se usa o termo martírio para explicar, em forma figurada, uma aflição, tortura, tribulação, dor. Quando vemos alguém sofrendo muito, seja por uma doença ou por problemas pessoais com filhos ou parentes, dizemos que a vida dele é um martírio. Mas os sentido original do termo não era esse.

Na cruz, Cristo nos deu o seu testemunho. Sendo santo e justo, morreu pelos injustos e pecadores, apagando os nossos pecados e nos reconciliando com Deus. Então, tem o significado de alguém que, por sua morte, testemunha o amor por outrem ou é capaz de morrer no lugar de outro, a substituição vicária. Um adendo: é importante ressaltar que Cristo foi um homem sem pecados ou máculas, o homem perfeito que, como Filho, em tudo agradou e serviu ao Pai. Portanto, ele não levou sobre si nada além dos pecados daqueles que o Pai entregou em suas mãos, ele nos substituiu, tomou o nosso lugar, pagando o preço que nos era impossível pagar.

Neste aspecto todo homem é um mártir em potencial, pois a vida, em decorrência do pecado, trará mais aflições e tribulações ao homem pelo distanciamento de Deus, e, quanto mais distante mais o sofrimento se acentua.

Porém, nós, que somos filhos de Deus, podemos experimentar a dor e o sofrimento e a angustia, contudo, temos o refrigério e o consolo divinos de saber que nos momentos mais difíceis Deus cuida e zela por nós.
Um exemplo que sempre me chamou a atenção foi o de Pedro. No livro de Atos, após a morte de Tiago, Pedro é preso pelo rei Agripa, que pretendia martirizá-lo para satisfazer ao desejo homicida do povo de Israel. Contudo, maravilhosamente, sabendo que morreria no dia seguinte, Pedro, algemado entre dois soldados e com guardas à porta para escoltá-lo até o local da morte, dormiu tranquilamente, de forma que foi necessário o anjo do Senhor tocar na sua ilharga para acordá-lo.

Podemos imaginar o que Pedro pensava da sua condição?

E nós, como estaríamos em seu lugar?

Pedro estava disposto a se sacrificar, a testemunhar com a própria vida a vida que Cristo lhe dera. Interessante que no A.T. as ovelhas eram sacrificadas para anular os pecados do povo de Israel. O sacrifício de Cristo veio livrar-nos e apagar definitivamente os nossos pecados, do seu povo. E agora Pedro estava disposto a seguir o exemplo do Senhor e morrer em nome daquele que lhe dera perdão e vida. O martírio era um testemunho de que nada neste mundo poderia impedi-lo de servir ao seu Senhor.

Pedro deu-nos uma demonstração de fé, de que mesmo na morte é possível perder a vida para louvar e bendizer o nome do Senhor. Não foi isso o que o Senhor disse? Aquele que guardar a sua vida,da neste mundo poderia impedi-lo de servir ao seu Senhor. ovo de Israel. perde-la-á, o que perdê-la, ganha-la-á [Mt 16.25]. Pedro se importava com a sua vida apenas se ela servisse para a obra do Senhor, usá-la para louvor do seu nome santo.

No ano 391 da era cristã, um monge chamado Telêmaco foi a Roma, por ter ouvido o chamado de Deus para ir lá. Entrando na cidade, em dado momento, ele se viu cercado por uma turba de pessoas alvoroçadas e, impelido por elas, entrou no Coliseu onde se reiniciariam os jogos dos gladiadores. Constantino havia proibido a morte nas arenas setenta anos antes, mas o novo imperador, por pressão popular, decidiu legalizá-los novamente. Ao ver a fúria dos gladiadores lutando e matando-se uns aos outros, o velho monge desceu as escadarias e entrou na arena se colocando entre os lutadores e dizendo: Em nome de Cristo, parem! A turba se enfureceu com ele e incitou os gladiadores que o hostilizaram. Colocado de lado por um deles, ao ver a luta se reiniciar, colocou-se novamente entre os dois, e foi desferido mortalmente por um golpe de espada. A turba até então ruidosa calou-se. Em meio ao silêncio das 80.000 pessoas pode-se ainda ouvir o moribundo dizer: em nome de Cristo, parem! Um a um os membros da platéia sairam em silêncio. Com a morte de Telêmaco, definitivamente os jogos de gladiadores foram extintos no Império Romano.

Hoje os testemunhos, com raras exceções, são meros discursos ou palavreado vazio e sem sentido, onde, na maioria das vezes, o que se diz é diametralmente oposto ao que se faz. Cristo viu isso em seu tempo com os fariseus, os mestres do seu tempo. Ele disse ao povo para seguir o que eles diziam, e que era a própria revelação de Deus, mas jamais fazer como eles faziam. Utilizam-se da retórica para, erroneamente, proclamar algo que vai muito além das palavras. Sabemos que sem a linguagem humana o Evangelho não seria proclamado. Mas, muitas vezes, o testemunho [e lembre-se que testemunho é sinônimo de martírio] falará muito mais do que um milhão de palavras. O testemunho de Cristo falou por si mesmo. Assim com os já citados.

Na teologia há um termo que se chama "ortopraxia", o qual quer dizer a prática correta. É preciso aliar a teologia correta ou a crença correta [ortodoxia] com a prática correta. Penso que Tiago [Tg 2.18], ao se referir às obras mortas falava exatamente disso, do discurso vazio, que se acomoda intelectualmente mas não produz resultado prático ou os frutos aos quais o Senhor Jesus se referiu. E como toda a árvore que não dá bons frutos é cortada e lançada no fogo eterno, assim será para os que têm o correto na mente mas não o aplicam no seu dia-a-dia. Eles enganam a si mesmos [Mt 7.15-20].

Então, gostaria de finalizar com um trecho da biografia do pr. William Carey. Em uma carta, escrita em 17.08.1831, escrita a Jabez Carey, quando estava em Serampore, Índia, ele disse:

"Hoje estou fazendo setenta anos, o que é um monumento à misericórdia e bondade divina, apesar de, numa revista de minha vida, eu encontrar muitas coisas pelas quais devia ser humilhado no pó. Meus pecados ostensivos e concretos são inumeráveis, minha negligência no trabalho do Senhor foi grande, não promovi sua causa nem busquei sua glória e honra como deveria. Apesar de tudo isso fui poupado até agora e ainda sou mantido em sua obra, queria ser mais consagrado ao seu serviço, mais santificado, praticando as virtudes cristãs e produzindo frutos de justiça, para louvor e honra do Salvador que deu sua vida em sacrifício pelo pecado".
Notas: 1- Aula realizada na E.B.D. do Tabernáculo Batista Bíblico;
2- Este trecho, e algumas passagens não citadas no presente texto, encontra-se melhor explicado no áudio da aula;
3- Baixe o áudio desta aula em Aula 37.MP3

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 36: A idolatria unitarista



Por Jorge Fernandes Isah



Primeiro, duas retificações:

Na aula passada eu disse que os unitaristas são extremamente racionais, quando quis dizer que eles são extremamente racionalistas, no sentido de que precisam desconstruir a verdade para tentar reconstruí-la ao seu modo de pensar natural, onde não há espaço para o sobrenaturalmente revelado na Escritura. Racional é aquele que se utiliza da razão como faculdade que Deus nos deu para compreender a realidade e para conhecer... Uma das faculdades, eu não estou afirmando que a única capaz de conectar o homem à realidade e ao conhecimento. Já os racionalistas agem de forma diferente, para eles, a razão é suprema, absoluta e tudo somente pode ser explicado por ela. Nós, cristãos bíblicos, somos racionais e não racionalistas, como são os unitaristas.


Em um momento, mais exaltado, eu disse que tinha a vontade de proferir um “palavrão”, me referindo aos hereges. Na verdade, eu não pensei em um palavrão específico ou mesmo nesse sentido, de baixo calão, mas em um xingamento do tipo “raça de víboras”, “filhos do diabo”, “emissários de satanás”, “dissimulados”, e outros relacionados que os identificassem, revelando o que realmente são, enganadores, como filhos do diabo. Se por acaso escandalizei a algum irmão, perdoe-me, pois não foi a intenção.

Obviamente, muito mais sofisticada e sutil do que o texto do auto denominado "apóstolo", foi a forma com que Eusébio proferiu a sua heresia. Ao ler o seu escrito temos uma aparente ode de louvor a Deus, se não fosse um pequeno trecho em que ele joga tudo por terra, bem aos moldes da vaca que deu 100 litros de leite e coiceiou o latão derramando-o, sem que sobre uma única gota. Assim agem os mais astutos; não querem muitas vezes serem explícitos, e para camuflarem os seus intentos, dizem o que não querem dizer para transmitir o que desejam efetivamente. É o que se apreende das linhas cavilosas do falso bispo:

"E quem, a não ser o Pai, poderia conceber sem impureza a luz que é anterior ao mundo e a sabedoria inteligente e substancial que precedeu aos séculos, o Verbo vivente no Pai e que desde o princípio é Deus, o primeiro e único que Deus engendrou antes de toda a criação e de toda a produção de seres visíveis e invisíveis, o general do exército espiritual e imortal do céu, o anjo do grande conselho, o servidor do pensamento inefável do Pai, o fazedor de todas as coisas junto ao Pai, a causa segunda de tudo depois do Pai, o Filho de Deus, genuíno e único, o Senhor, o Deus e Rei de todos os seres, que recebeu do Pai a autoridade soberana e a força, junto com a divindade, o poder e a honra? Porque, em verdade, segundo o que dizem d’Ele os misteriosos ensinamentos das Escrituras: No princípio era o Verbo e o Verbo estava em Deus e o Verbo era Deus. Todas as coisas foram feitas por Ele, e sem Ele nada foi feito”.

Eusébio chamou Cristo de Verbo e Deus, tomando o cuidado de colocar tudo em maiúsculas, para em seguida afirmar que ele é um ser temporal e criado. O bispo não se furtou a nominá-lo assim como os cristãos acreditam e devem crer em todos os tempos, Cristo é Deus, o Verbo encarnado; porém, em meio as palavras belas e elogiosas inseriu deliberadamente a parte em que afirma ser ele “o primeiro e único que Deus engendrou antes de toda a criação”, negando exatamente o que dissera antes ou, no mínimo, afirmando a grande confusão que tinha a respeito do ser perfeito, santo, eterno, infinito e absoluto de Cristo. Pois ainda que ele e o seu mestre, Ário, cressem que Cristo detinha algum tipo de divindade, sempre procedendo do próprio Deus, ela não era da mesma estirpe, essência e natureza que a divina. A própria utilização do termo “engendrou”, de que Deus engendrou a Cristo, dá a idéia de criação, de que o Filho somente veio à existência [e vir à existência significa que em algum momento ele não existia] porque Deus quis. De forma que Cristo não participaria, portanto, dos mesmos atributos de Deus, e não poderia ser considerado como tal, já que em algum momento na eternidade ele não existia. E se não existia, não se pode considerá-lo nem mesmo como Deus, pois muitos dos atributos divinos estão atrelados e presos à eternidade, como o ser absoluto, infinito, autossuficiente, ilimitado... Somente o eterno pode ter em si esses atributos. Então a afirmação de Eusébio é ainda mais dissimulada e contendo a intenção de confundir, pois não é possível que um homem culto como ele desprezasse essas questões. Ao afirmar que Cristo é Deus e o Verbo encarnado, tentou suavizar a heresia que defendia e na qual cria, como se o entregar-se a uma bajulação diminuísse ou anulasse a sua culpa, não evidenciando, ou melhor, atenuando as suas reais intenções. E quais eram elas?


Utilizando-se de uma linguagem ortodoxa, de termos próprios da fé cristã, ele tentou mascarar, encobrir sua blasfêmia com floreios e uma falsa exaltação, nitidamente com o intento de espalhá-la, de semeá-la no seio da igreja. E o resultado disso seria confusão, a partir do momento em que muitos a admitiram como verdade defendendo-a, enquanto outros a rejeitaram prontamente. Paulo, à sua época, já nos alertava quanto a esse tipo de inimigo: “E rogo-vos, irmãos, que noteis os que promovem dissensões e escândalos contra a doutrina que aprendestes; desviai-vos deles. Porque os tais não servem a nosso Senhor Jesus Cristo, mas ao seu ventre; e com suaves palavras e lisonjas enganam os corações dos simples” [Rm 16.17-18]. Por corações dos simples, creio que o apóstolo está a falar dos ingênuos e fracos na fé, que podem ser pessoas incultas ou cultas, mas que se deixarão levar pelo discurso retórico, por palavras bonitas, espirituosas, até mesmo glamorosas, como objetivo de seduzi-las ao engano e à mentira. Não porque foram obrigadas a isso, mas porque os seus corações desejaram e queriam, em sua soberba e orgulho espirituais, se enganarem.

O que Eusébio e Ário queriam era conquistar a simpatia dos demais cristãos a partir da pregação de um falso evangelho; fazer prosélitos e ampliar seu poder e influência. Em linhas gerais, eles se portaram como usurpadores do trono de Deus, como aqueles, dentre muitos, que o desprezam e ao seu governo e senhorio. E com esse tipo de gente não há muito o que se dizer, a não ser, fora! Se não quiserem sair, saiamos nós.

Igualmente, ao dizer que o Senhor “recebeu do Pai a autoridade soberana e a força, junto com a divindade, o poder e a honra”, suas reais intenções ficam evidentes, de que Cristo nada mais é do que uma criatura dotada por Deus de habilidades e poderes que somente tem por conta do que Deus lhe deu. A divindade inseriu-se nesse contexto, como mais um dom, algo exterior que lhe é dado ou facultado, não como algo inerente à sua natureza, pois o que eles estão a tratar como “divindade” é uma sub-divindade, semelhante mas distinta, relativa e não absoluta, que faz de Cristo uma criatura especial, sem, contudo, jamais ser Deus.

Entendem como se processa a mente cavilosa?

Devemos estar atentos aos sinais que esses falsos profetas demonstram, seja no passado ou no presente. Eles estão em todos os lugares e épocas, e não podemos desprezá-los em sua capacidade de corromper e aliciar aos “corações simples”, pois ainda que não inocentes, pois não há inocentes neste mundo, devemos mostrar o grau e o nível de insulto que esses ímpios são capazes de realizar e, assim, pela graça de Deus, ser instrumentos para abrir os olhos de alguns e trazê-los novamente à realidade, à verdade máxima sem a qual o Cristianismo não seria nada além de uma religião agonizante e, provavelmente, extinta: Cristo é, assim como o Pai e o Espírito Santo, Deus! Bendito seja a Santíssima Trindade ou, ainda mais significativamente, a Santíssima Triunidade de Deus!

Não é preciso se buscar muito para encontrar o antídoto para as heresias. A santa e bendita palavra de Deus traz em si todos eles. E, novamente, Paulo o revela em Efésios 1.3-14:
"Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos tem abençoado com toda sorte de bênção espiritual nas regiões celestiais em Cristo, assim como nos escolheu nele antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis perante ele; e em amor nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito de sua vontade, para louvor da glória de sua graça, que ele nos concedeu gratuitamente no Amado, no qual temos a redenção, pelo seu sangue, a remissão dos pecados, segundo a riqueza da sua graça, que Deus derramou abundantemente sobre nós em toda a sabedoria e prudência, desvendando-nos o mistério da sua vontade, segundo o seu beneplácito que propusera em Cristo, de fazer convergir nele, na dispensação da plenitude dos tempos, todas as coisas, tanto as do céu, como as da terra; nele, digo, no qual fomos também feitos herança, predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade, a fim de sermos para louvor da sua glória, nós, os que de antemão esperamos em Cristo; em quem também vós, depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação, tendo nele também crido, fostes selados com o Santo Espírito da promessa; o qual é o penhor da nossa herança, ao resgate da sua propriedade, em louvor da sua glória."

Bem, o que temos neste trecho escrito pelo apóstolo? A unidade de Deus na salvação do homem, através da atuação das três pessoas da Triunidade, de forma que o Pai elegeu ou escolheu-nos em Cristo, o qual é o redentor do eleito, e coube ao Espírito Santo selá-lo para a vida eterna.

Algo que devemos entender é que essa relação da Triunidade não é fortuita, aleatória, acidental ou ocasional. Na verdade ela é essencial, real, em seu caráter absoluto, de forma que não somos nós que definimos a Triunidade de Deus na pessoa do Pai, do Filho e do Espírito Santo, como uma analogia do que é uma família humana para representar o que é divino. Não. É a unidade e diversidade de Deus que nos define como indivíduos mas também como corpo familiar. A imagem do Pai e do Filho, principalmente, não foi utilizada para tentar explicar a relação eterna que há entre eles, mas somos nós que refletimos aquilo que Deus é em seu caráter relacional. De forma que a relação entre eles é que é original, não a nossa. A relação divina está expressa na figura do Pai, pela sua paternidade, pela ligação íntima que tem com o Filho, este pela filiação ou relação correspondente que tem com o Pai, e o Espírito Santo pelo amor que une o Pai ao Filho. Nada disso é mera convenção ou ficção, mas o que a Bíblia nos revela e que pode ser demonstrado pelo texto de Efésios acima.

Entendo que, mais do que a declaração de doutrinas bíblicas, Paulo está a nos revelar nesses versos a relação que há entre as pessoas da Triunidade, as quais sendo distintas em suas atuações e personalidades é um único ser: Deus. Somente assim é possível entendê-lo e à sua revelação. Se a Triunidade não é uma doutrina bíblica, toda a revelação fica sem sentido; porque, como está claro e evidente, a salvação do homem é do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Se assim não for, como entender a obra que Deus realiza em nosso meio? Como explicar a revelação especial? Em que o Pai salva, o Filho salva e o Espírito Santo salva? Afinal, não temos três "etapas" de uma mesma salvação? Que elege, redime e sela? Pode-se ser salvo sem ser eleito? Ou redimido? Ou selado? A resposta é não. A fé no Pai, que nos elegeu, somente é possível se ele for Deus. A fé em Cristo, como Senhor e Salvador, somente é possível se ele for Deus. Igualmente, a fé no Espírito Santo, como o Consolador, aquele que habita em cada um dos eleitos, somente é possível se ele for Deus. Como se pode adorar um ser criado ainda que com super-poderes? Ou que é uma emanação ou força que, via de regra, não é o próprio Deus? Se sem fé é impossível agradá-lo, como posso agradá-lo crendo no que ele não é? Cristo, como criatura, pode receber a minha fé? Que no fim-das-contas é proveniente de Deus? O Espírito, como força, poderia também recebê-la? Se Deus é apenas um, o Pai, como dizem os unitarianos de várias correntes, apenas ele deve receber a nossa fé, a fim de agradá-lo. E boa parte da Escritura, tanto no AT como no NT, terá de ser rasgada e jogada fora. Praticamente tudo o que a Bíblia nos revela não teria sentido, pela ótica unitarista, caso o Filho e o Espírito Santo fossem partes subordinadas de Deus ou criadas por ele. Não falo apenas em seu caráter lógico, mas também prático e funcional, onde não há sentido, nem razão. Com isso, chego a pensar que os verdadeiros triteístas são os unitaristas que adoram, creem e têm fé em criaturas ou estados que, em suas essências, não são Deus. Em suas formulações simplistas e racionalistas acabam por atirar no próprio pé, tornando-se em idólatras. E, então, a acusação de que somos acusados torna-se em sentença para eles, colocando-os no posto de idólatras e infratores do primeiro mandamento, o que os condenará. Todo o reducionismo racionalista, aliada à rejeiçao da revelação especial, faz com que sejam aquilo que mais temem ser, e não se vêem como são.

Como disse na primeira parte desta introdução, é impossível que o Filho e o Espírito Santo tenham os mesmos atributos que o Pai, se não forem igualmente eternos e absolutos. De forma que, por exemplo, o Filho não poderia ser onipresente [Mt 18.20], e o Espírito Santo não poderia ser onisciente [1Co 2.10-11].

Leiamos alguns versículos e atentemos para o que eles nos revelam. Sem exceção, mostrar-nos-ão mais do que a prova de que todas as pessoas da Triunidade são idênticas em sua natureza e atributos, porém distintas em suas personalidades; revelarão a forma como se relacionam entre si, e que pode ser definido como o ser tri-pessoal em sua íntima ligação.

Textos: 1Co 12.4-6; 2Co 13.14; 1Pe.1.2; 1Jo 5.7; Jd 20-21, o que temos de comum em todos eles é a declaração de que existe uma coordenada relação entre as pessoas da Triunidade, sem que haja divisão, sem confusão entre si, mas em unidade de essência. Entender a doutrina da Triunidade por meio da mente caída e limitada do homem é algo realmente impossível. Ela somente pode ser compreendida e aceita como fundamento sobrenatural. O próprio Deus é quem se encarrega de nos revelar a verdade e nos capacitar a crer, confiar e proclamá-la, sem o qual o Cristianismo seria uma religião sem nexo e sentido algum, pois o centro é Cristo por quem exclusivamente o Pai é revelado.

Antes de terminar, quero deixar uma questão para reflexão: Se Deus é amor, quando ele amou? E a quem? A si mesmo? Ou somente após a criação esse atributo manifestou-se? Ou esse amor é eterno e retributivamente eterno na relação das três pessoas da Trindade? Ou teremos de aceitar que, em sua imutabilidade, um dos atributos divinos é temporal e apenas pode ser explicado através da Criação? Se Deus é amor, faz-se necessária uma fonte eterna ou melhor, um objeto eterno, para que ele se manifestasse, do contrário Deus não amou sempre, e esse amor é limitado por suas criaturas.


Notas: 1 - Os textos bíblicos citados são explicados mais detalhadamente no áudio desta aula.
2 - Aula realizada na EBD do Tabérnaculo Batista Bíblico.
3- Baixe o áudio desta aula em
Aula 36.MP3

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 35: A Trindade e os "cristãos" que não reconhecem a Cristo



Por Jorge Fernandes Isah

 
INTRODUÇÃO
Antes de entrarmos propriamente na doutrina da Trindade, a qual passaremos a chamar de Triunidade, a fim de não confundi-la com o triteísmo, farei uma apanhado da crença herética do antitrinitarianismo.
 
Primeiro, há de entender que o judaísmo, o islamismo e o cristianismo são as únicas grandes religiões monoteístas do mundo. Muitos judeus e islâmicos consideram que somos triteístas, de que acreditamos em três deuses, pelo fato de não se interessarem pelo estudo da doutrina da Triunidade e, portanto, ao não fazê-lo, não compreendem-na, ou por uma deliberada má-vontade e oposição com o objetivo de nos rechaçar das suas companhias. Entendo que também não temos interesse nessa companhia porque, apesar de monoteístas, tanto judeus como islâmicos estão equivocados em sua fé e desprezam flagrantemente a revelação divina, a Bíblia Sagrada. Para o judaísmo existem apenas os livros do AT e aqueles que fazem parte da sua tradição, os quais não são livros inspirados; enquanto para o islã há somente o livro de Maomé, ainda que eles se reconheçam como herdeiros do patriarca Abraão, e reconheçam alguns dos nossos profetas como enviados por Alá. Ambos rejeitam peremptoriamente o NT como livro sagrado, como a palavra fiel de Deus, e a Jesus Cristo como Senhor e Salvador, como a segunda pessoa da Santíssima Trindade.
 
Este estudo tem por objetivo esclarecer os princípios norteadores da doutrina da Trinitariana existentes na Escritura Sagrada e, em caráter secundário, demonstrar a falácia dos que se opõem à Triunidade de Deus.
 
Da mesma forma, temos de distinguir os movimentos que se consideram cristãos mas nada têm de bíblicos, como os unicistas e o unitarianistas. A importância de reconhecê-los com clareza é fundamental para que não sejamos presas fáceis dos enganos perpetrados por essas correntes teológicas. Muitos se misturam no nosso meio com o intuito de enredarem incautos para suas doutrinas espúrias e diabólicas, já que uma característica das seitas é o proselitismo. Há muitos cristãos bíblicos que os consideram como a irmãos, talvez acometidos pela condescendência, pela ignorância ou seduzidos pela astúcia deles. O fato é que Deus nos exorta a afastar-nos e a rejeitar qualquer proposição que não seja bíblica, pois enquanto devemos batalhar pela verdade, aqueles estão interessados exclusivamente na difusão da mentira, e qualquer associação com eles nos fará igualmente mentirosos ou, no mínimo, transigentes com a mentira [Tt 3.10-11]. A questão é que estamos muito preocupados em parecer conciliadores, amistosos e flexíveis, quando devemos ser intransigentes e repelir tudo o que vai contra a sã doutrina. Como o apóstolo Pedro disse diante do sumo sacerdote: “Mais importa obedecer a Deus do que aos homens” [At 5.29].
 
Ainda que o estudo não seja exaustivo, ele nos dará o fundamento necessário para defender a fé cristã e rejeitar o falso cristianismo, e, mais do que isso, aperceber-nos de que muitos deles, utilizando-se de argumentos ou raciocínios ardilosos, querem confundir e transtornar irmãos ingênuos ou de boa-fé, apresentando-se como iguais quando em nada se lhes assemelham. O espírito deles é guiado pelo enganador, e devemos estar atentos para os sinais que eles apresentam e que, no início, não são muito perceptíveis, mas se tornam evidentes com o tempo, ao rejeitarem a revelação especial para dar ouvidos à mentira que, em seu discurso, tem alguma aparência de verdade.
 
A fé cristã é uma, mas muitos grupos se apropriam do termo Cristianismo para terem seu trabalho facilitado. E, para isso, utilizar-se-ão do que foi dito pelos hereges no passado, os quais já existiam à época dos apóstolos, para garantirem o uso do designativo “cristão”. O fato de reconhecerem Cristo como o Messias, Salvador, ou o enviado de Deus para revelar a sua vontade ao mundo é suficiente para que se autodenominem com tal. Não importa se o que pensam de Cristo é diametralmente oposto ao que ele é e se deu a revelar na Escritura. Importam-lhes mais embaraçar, se misturar, de forma que os tolos e ignorantes, aqueles que não sabem dar a razão da sua fé, não percebam as diferenças entre o que eles dizem e o que a Bíblia afirma. E a ignorância de muitos, aliada à astúcia daqueles, fazem com que sejam reputados como seguidores de Cristo quando, na verdade, odeiam-no, ao desprezarem-no, ao não reconhecerem quem ele é, ao tentarem fazer dele uma outra pessoa ou personalidade.
 
Interessante que quase sempre é ele, Cristo, o pomo da discórdia, e que somente acontece por obra exclusiva daqueles que, pela própria incredulidade, negam a sua divindade.

"CRISTÃOS" QUE NÃO RECONHECEM A CRISTO

Há entre os cristãos [uso o termo de maneira ampla e genérica, abrangendo todos os que se autodenominam cristãos] dois grandes grupos doutrinários: os trinitarianos e os antitrinitarianos.
 
Entre os opositores da fé bíblica, encontramos dois subgrupos:
 
1) Os unitarianos;
2) Os unicistas.
 
Eles afirmam, via de regra, que o Pai, o Filho e o Espírito Santo são meros nomes, modos, estados ou aspectos de uma mesma pessoa, de forma que Deus assumiria modos diferentes ao invés de ser três pessoas distintas [modalismo, sabelianismo, patripassianismo]; ou de que Jesus Cristo não é Deus mas um deus inferior, uma espécie de semi-deus, criado pelo verdadeiro Deus, e por ele capacitado com alguns “poderes”, podendo mesmo ser adorado como Deus [arianismo]. Com isso, eles dizem que Cristo é divino em algum aspecto, mas não é Deus em essência [algumas das várias formas de unitarismo]. Já o Espírito Santo pode ser tanto um ser criado por Deus, com a ajuda do Filho, como uma força emanada do próprio Deus [esta visão é bem próxima do que crêem as Testemunhas de Jeová, que poderiam ser chamados de semi-arianos].

Outra variação dessa mesma doutrina diz que Cristo é Deus, e como a Bíblia diz que há um único Deus, Jesus Cristo é Deus em plenitude, sendo ele o Pai, o Filho e o Espírito Santo [unicismo]. Esta corrente doutrinária está em processo de difusão entre os pentecostais, especificamente.

Em sua maioria, os unitaristas e unicistas são também universalistas, acreditando que haverá uma salvação final para todos os homens, inclusive o diabo e seus demônios, como propunha Orígenes. Além de não crerem na divindade de Cristo, rejeitam-no como Salvador e Redentor.
 
Há uma boa variedade de conceitos díspares nessas crenças, dependendo do grupo que se estude, podendo ser em maior ou menor grau as divergências, mas resumida o suficiente para considerá-los hereges. Seria essa a linha geral de suas doutrinas. Podemos desconsiderar os detalhes capciosos das doutrinas antitrinitarianas, pois esse elemento geral está presente em tudo o que os rege, e em tudo o que professam.
 


LOBO EM PELE DE OVELHA ENTRE OS TOLOS E INCAUTOS

Alguns, se utilizam de formas engenhosas e sutis de se expressar, como o bispo Eusébio de Cesárea: “E quem, a não ser o Pai, poderia conceber sem impureza a luz que é anterior ao mundo e a sabedoria inteligente e substancial que precedeu aos séculos, o Verbo vivente no Pai e que desde o princípio é Deus, o primeiro e único que Deus engendrou antes de toda a criação e de toda a produção de seres visíveis e invisíveis, o general do exército espiritual e imortal do céu, o anjo do grande conselho, o servidor do pensamento inefável do Pai, o fazedor de todas as coisas junto ao Pai, a causa segunda de tudo depois do Pai, o Filho de Deus, genuíno e único, o Senhor, o Deus e Rei de todos os seres, que recebeu do Pai a autoridade soberana e a força, junto com a divindade, o poder e a honra? Porque, em verdade, segundo o que dizem d’Ele os misteriosos ensinamentos das Escrituras: No princípio era o Verbo e o Verbo estava em Deus e o Verbo era Deus. Todas as coisas foram feitas por Ele, e sem Ele nada foi feito”.


Outros, sem sutileza alguma, expressam aquilo que lhes vem à mente sem qualquer constrangimento em suas falsas autoridades, como certo autodenominado “Apóstolo”, que escreveu no site da sua igreja, e, posteriormente, suprimiu o texto sem qualquer explicação: “Muita gente pela tradição da religião, não entende a historia de Jesus. Alguns falam de natal, mas ninguém sabe o dia exato em que Jesus Cristo nasceu. Segundo que Jesus já existia muito antes de tudo. Ele é a imagem do Deus invisível, a encarnação do verbo. Mas ele não é sempiterno, é eterno. O pai que é Deus é sempiterno, aquele que antes dele nunca existiu como ele, nem existirá depois dele, sempre existiu e sempre existirá. A primeira obra dele foi Jesus Cristo, não a partir de Maria, que foi obra do Espírito Santo para ser feito carne, antes ele já existia. “Façamos” é no plural, porque Jesus estava com Ele e a palavra que lemos confirma”.
 
Analisemos o que nos diz o famigerado "apóstolo", e que não é difícil de se refutar. Pois bem, ele diz: "Muita gente pela tradição da religião não entende a história de Jesus". Qual é o alvo do seu ataque? A igreja, que durante séculos e séculos tem sido usada pelo Espírito Santo para defender a fé cristã e a sã doutrina, em especial, o centro do Cristianismo, sem o qual ele não teria o menor sentido ou significado: a divindade de Cristo. O que ele está tentando dizer é que tudo o que a igreja acreditou durante os últimos dois mil anos a respeito do Senhor é fruto da ignorância. Ele diz que ela “não entende a história de Jesus”. Assim se coloca numa posição privilegiada, numa condição superior, de crítico e de único entendedor ou, talvez, de participar de um seleto grupo de entendedores a respeito de quem é o Cristo. Até então, houve apenas um ataque sem fundamentação, sem argumentação, de simples especulação, de que a culpa de toda a ignorância da igreja sobre o assunto é fruto da tradição. Mas em quê essa tradição [que podem ser todos os debates ao longo da história da igreja, que podem ser os Concílios, os estudos meticulosos de homens fiéis que se debruçaram sobre as Escrituras, o testemunho dos santos que foram martirizados pelo nome de Cristo], pode levar a igreja à ignorância por tanto tempo?
 
Sabemos que desde os primórdios satanás levantou homens na igreja para atacarem a verdade: Ário, Montano, Sabélio, Marcião, Nestório, Socino, Serveto e muitos mais como eles. E eles mesmos seguem uma tradição de, tempos em tempos, retornarem ao próprio vômito, numa espécie de “revival” maligno. Afinal essa heresia não foi criada pelo “apóstolo”, nem pelos seus seguidores, mas ela remonta aos séculos 2 e 3 da era cristã. Portanto, o único argumento utilizado pelo “apóstolo”, de que a ignorância da igreja se deve à tradição, é um tiro no próprio pé.
 
Em seguida, para defender o seu argumento de que a tradição é culpada pela ignorância da igreja, ele se utiliza do natal para justificá-la. Ora, se o fato da Bíblia não revelar a data exata do nascimento de Jesus implica em que o natal nada mais é do que uma tradição, sem base bíblica, a crença na divindade de Cristo somente pode ser equiparada ao natal, como fruto de outra tradição da igreja. Acontece que, se a Bíblia não revela a data exata do nascimento do Senhor, isso não quer dizer que não se possa comemorá-la, não como uma data específica mas como o advento da encarnação do Verbo divino. A mesma Bíblia nos dá uma profusão de trechos e versos em que a divindade do Senhor Jesus é declarada.
 
Então, ele diz sobre Cristo: "Ele é a imagem do Deus invisível, a encarnação do verbo. Mas ele não é sempiterno, é eterno. O pai que é Deus é sempiterno, aquele que antes dele nunca existiu como ele, nem existirá depois dele, sempre existiu e sempre existirá".
 
Tem-se a afirmação de que o Senhor é a imagem do Deus invisível, a encarnação do verbo, o que é uma verdade. Mas dita por sua boca, certamente os termos “imagem” e “encarnação do verbo” têm sentidos diversos do que a Escritura diz. Quando ele escreve “encarnação do verbo” em minúsculas demonstra ter a idéia de que o verbo não pode ser equiparado a Deus. De que ele é inferior e não faz jus ao “V”. Isso não é descuido, mas intencional. Com a aparência de verdade, ele distorce-a, e cria uma mentira.
 
A expressão “imagem” estará ligada a uma certa aparência, a uma certa semelhança, que não é igualdade essencial, assim como nós somos semelhantes e a imagem de Deus. Em outras palavras, o “apóstolo” está dizendo que, como nós, Cristo é um ser criado, parecido com Deus, mas não é Deus. Logo, ele mesmo confirma o dito com um jogo de palavras ao diferenciar “sempiterno” de “eterno”. Fiz uma busca em vários dicionários portugueses e o que encontrei não foi distinção entre os termos mas igualdade. Sempiterno e eterno são sinônimos em, pelo menos, três dicionários conceituados, Priberan, Michaellis e Aurélio.
 
Mas pode ser que ele tenha proferido a sentença não do ponto de vista semântico, mas do ponto de vista filosófico. Porém, se ele vislumbrou essa diferenciação a partir da conceituação dos termos, deveria indicá-la, explicando o sentido que lhes deu. Mas, pelo pouco que compreendo de filosofia, o sempiterno e eterno significam a mesma coisa. Fico com a definição de Tomás de Aquino, na qual eterno é a “posse total, simultânea e perfeita de uma vida sem limites", caracterizada pela ausência de princípio e fim, e pela ausência de sucessão, porquanto, para ele, é um presente eterno.
 
Distinguir o que é igual em nada ajudará o “apóstolo”, mostrando apenas a sua incapacidade em lidar corretamente com a questão. Mas a distinção tem por objetivo unicamente rebaixar a Cristo, reputando-o como criatura e não como Deus eterno. Então, ele diz que “O pai que é Deus é sempiterno”. O fato de se distinguir Deus chamando-o de “pai” já mostra a confusão em que o “apóstolo” se meteu, ou a confusão que deseja meter nas cabeças alheias. Os unitaristas e unicistas em sua loucura, e como todo louco é incoerente, utilizam-se dos termos trinitarianos para explicarem sua heresia. Não lhes bastam as palavras do próprio Deus, creio que seria necessário que estivessem lá, in loco, para ver que o Pai, o Filho e o Espírito Santo sempre são; mas isso os faria iguais a ele, então penso que essa deve ser a maior frustração deles: já que não podem ser Deus, imaginam que a saída seja se rebelarem contra ele da forma mais baixa e desprezível possível, atacando aquele que disse: quem vê a mim, vê ao Pai [Jo 14.7-9], e, “Porque, como o Pai tem a vida em si mesmo, assim deu também ao Filho ter a vida em si mesmo” [Jo 5.26]. Ah, como gostaria que eles explicassem esses versos sem os malabarismos que insistem em executar, quando estão acuados pela verdade.
 
Mais à frente em nosso estudo, meditaremos sobre a Pessoa de Cristo, em seus aspectos divinos e humanos, o que dará o entendimento correto sobre as afirmações bíblicas sobre ele, e que os unitaristas, como o “apóstolo” negligenciam vergonhosamente, para a sua própria desgraça.

Notas: [1] Aula realizada na E.B.D. do Tabernáculo Batista Bíblico
[2] Baixe o áudio desta aula em file.MP3

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 34: O poder soberano de Deus - Parte 2



Por Jorge Fernandes Isah



Introdução
Espero que os irmãos tenham lido o texto da semana passada, e possamos concluí-lo na aula de hoje.
Fazendo um pequeno resumo, analisamos a questão da soberania de Deus a partir de um diálogo entre um padre e um ateu em um banco de praça.
Os irmãos se lembram do que foi discutida na última aula?
Poderiam apontar um ou mais pontos debatidos?
O primeiro ponto que levantei foi o de que os nossos inimigos estarão sempre dispostos e armados para desestabilizarem a nossa fé, de forma a virmos descrer nos fundamentos que nos sustentam.
Segundo, analisamos alguns versículos que afirmam ser Deus poderoso para realizar tudo, até mesmo o impossível, mas nunca contra a sua vontade e natureza. De forma que tanto a sua natureza como vontade são os limitadores de Deus, que o impedem de realizar tudo que não esteja consoante com a sua vontade, sabedoria, santidade, justiça, etc..
Um ponto que não foi discutido naquela aula e que gostaria de tocar agora é quanto a essa disposição do incrédulo de nos perverter e desencaminhar da fé. O que os irmãos acham? Isso é possível? Um crente verdadeiro descrer ou deixar-se corromper pelo discurso mundano e, mesmo temporariamente, como Pedro diz, voltar ao próprio vômito? Sendo mais específico, um crente pode apostatar ou desviar-se, no sentido de voltar às mesmas práticas e à mente que tinha antes da conversão?
Leiamos os seguintes textos [1]:
Jr 32. 38-40: "E eles serão o meu povo, e eu lhes serei o seu Deus; e lhes darei um mesmo coração e um só caminho, para que me tema todo os dias para seu bem e o bem de seus filhos, depois deles. E farei com eles uma aliança eterna de não me desviar de fazer-lhes o bem; e porei o meu temor nos seus corações, para que nunca se apartem de mim".
Jo 10.28,29: "E dou-lhes a vida eterna, e nunca hão de perecer, e ninguém as arrebarará da minha mão. Meu Pai, que mas deu, é maior do que todos; e ninguém pode arrebatá-las da mão de meu Pai".
Jo 6.37: “Todo o que Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora”.
Jo 17.2, 9: “Assim como lhe deste poder sobre toda a carne, para que dê a vida eterna a todos quantos lhe deste... Eu rogo por eles, não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus”.
E, então, temos uma grande promessa do Senhor: “Pai, aqueles que me deste quero que, onde eu estiver, também eles estejam comigo, para que vejam a minha glória que me deste; porque tu me amaste antes da fundação do mundo” [Jo 17.24].
Fp 1.6: “Tendo por certo isto mesmo, que aquele que em vós começou a boa obra a aperfeiçoará até ao dia de Jesus Cristo”
I Pe 1. 3-5: "Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo que, segundo a sua grande misericórida, nos gerou de novo para uma vivia esperança, pela ressureição de Jesus Cristo dentre os mortos. Para uma herança incorruptível, incontaminável, e que não se pode murchar, guardada nos céus para vós, que mediante a fé estais guardados na virtude de Deus para a salvação, já prestes para se revelar no último tempo".
Terceiro, em dado momento, o ateu propõe uma “pegadinha” ao padre, um sofisma, o qual é: Deus pode criar uma pedra que não pode carregar?
O padre afirma que sim, pode. E o ateu propõe que se Deus pode criar algo que não pode carregar, ele não é onipotente.
E se ele não puder criar a tal pedra, também não é onipotente.
Ao que o padre responde: “afinal, decida-se! Você quer que Deus crie a pedra ou que ele a carregue?". Na verdade, o ateu formulou duas afirmativas que se contradizem, o tal sofisma.
Quarto, E o padre ilustra o seu pensamento com o episódio da morte e ressurreição de Lázaro.

Continuemos de onde paramos na aula anterior; os comentários estarão sempre em itálico entremeados ao diálogo do padre e do ateu:

Deus pode criar, hipoteticamente, uma pedra que não possa carregar?

- Pois é. Como o senhor deve saber, quem pode o mais, pode o menos, ou seja, Jesus, de algum modo, poderia ter tirado a pedra, mas, também, de algum modo, não pôde fazê-lo. Ou seja, Deus criou aquela pedra e Deus não a pôde erguer.
O ateu não se deu por vencido:
- Bom, mas, como o senhor mesmo disse, Jesus poderia, sim, tirar a pedra, apenas não quis fazê-lo... Isso não é o mesmo que "não poder fazer".
- Mas, perceba: quando alguém pode tudo, pode, inclusive, limitar-se. Se não pode limitar-se, não pode tudo. Ademais, a sua dúvida está na onipotência de Deus, que Ele possa tudo e não que não possa alguma coisa... Se Ele não puder carregar a pedra, torna-se impotente, concorda?
O ateu sorriu como se o "rei" do padre estivesse, agora, fadado ao "xeque-mate”.
- Mas aí então, Deus não poderia criar uma pedra que não pudesse carregar...
- Mas é claro que pode, insistiu o padre:
Veja: Deus criou você para que você cresse nEle... mas você crê?
- Não, não creio.

O que os irmãos pensam dessa afirmação? Deus criou o homem para que cresse nele? De certa forma, sim. Acontece que no Éden, onde a humanidade caiu junto com Adão, a queda se deu exatamente por conta da descrença de Adão e Eva. Eles simplesmente duvidaram do que Deus havia lhes dito, preferindo crer no que o seu coração insensato dizia ou maquinava e na mentira da serpente.
Se Deus criou o homem para crer, ele não creu por si mesmo. O Éden prova isso. Para que o homem cresse, foi necessário que Deus operasse nele, de forma a mudá-lo e transformá-lo à imagem do seu Filho Amado.
Veja bem, todos os homens têm em si fragmentos de Deus, o Imago Dei, contudo esses fragmentos não revelam a condição pecaminosa e caída do homem, nem o seu estado de rebelião e desprezo a Deus, nem a necessidade de arrepender-se e reconciliar-se com Deus. Isso somente é possível pela ação do próprio Deus, regenerando o homem, o qual, então, estará ligado a ele, em constante transformação, santificação, para, enfim, naquele glorioso dia ser semelhante ao homem perfeito: Jesus Cristo.
Todos os homens, sem exceção, são descrentes, e nasceram em descrença. Aprouve a Deus chamar uma parte deles à fé, à crença em Deus, que se dará a partir da ação regeneradora e santificadora do Espírito Santo. De forma que, se Deus quisesse que todos os homens cressem nele, eles creriam, e se não crêem é porque Deus não criou a todos para crer, mas antes, ao menos no princípio temporal da vida de cada um, criou-nos para descrer. Cremos somente pela pregação do Evangelho, o qual o Espírito Santo usará para nos revelar a nossa condição e a necessidade de arrependimento, de se pedir perdão a Deus pela nossa condição incrédula e ofensiva diante dele.
Esta visão do padre, na verdade, antes de exaltar a soberania de Deus, revela que ele é um ser limitado por conta de suas criaturas, e que criou para si mesmo limitações exteriores, que de alguma forma alteram a sua essência, impedindo-o de ser o que é. Como a Escritura nos afirma que Deus é imutável, ele não pode, em hipótese alguma, ter limitações que não sejam estabelecidas por sua natureza santa e perfeita ou por sua vontade igualmente santa e perfeita, eternamente.
Um exemplo que se dá é de que Deus poderia criar vários mundos, inclusive perfeitos. E é uma verdade. Acontece que encontramos apenas um mundo, o qual ele considerou bom, e de que esse é o único mundo possível; e assim ele quis. Qualquer hipótese de outros mundos criados estará sempre circunscrita à vontade divina de criá-los, sem a qual, nada pode vir a ser. E a vontade divina tem por propósito uma única coisa, a meu ver: a glória de Deus! Que é revelada, entre outras coisas no todo poder com que ele realiza a sua vontade: na criação, na sustentação da criação, na redenção do homem, na preservação, santificação, e no reino eterno de Cristo, que não terá fim. Pois nada há que possa satisfazê-lo além de si mesmo, e tudo o que criou somente o satisfará se for realizado segundo a sua vontade. Logo, a vontade divina é a causa primeira, e o homem, ao rejeitá-la, ataca exatamente esse ponto inatacável [2].
Se Deus criou o homem para crer nele, e esse homem não crê, há um conflito de vontades e interesses, e o que temos é a vontade divina subjugada à vontade humana, estando essa prevalecente em relação àquela. Mas isso é viável? Claramente a Bíblia afirma que não. Deus se satisfaz em realizar a sua vontade, e ela acontecerá infalivelmente, sendo que Deus jamais se frustrará. 

- Pois é, continuou. Deus criou a sua liberdade e não pode removê-la, pois se auto-impôs esse limite. Com efeito, Deus pode tudo porque pode, inclusive, dizer o que não pode fazer. Quando alguém pode dizer o que não pode fazer, embora o possa, é porque, de fato, pode tudo.
O ateu agora estava em silêncio...
O padre pegou no seu ombro e concluiu:
Assim como a pedra que prendia Lázaro, a sua liberdade é algo que Deus criou, mas por uma auto-limitação, não se permite mover. A sua liberdade, meu amigo, é a pedra que Deus criou e que não pode mover.
Dizendo isso, afastou-se do ateu que permanecia pensativo no banco da praça, alheio à chuva mansa que se iniciara.
Lister Leão

Na verdade, Deus não pode criar uma pedra que não possa carregar, pois ele pode tudo, tanto criá-la como carregá-la. A proposição do ateu é simplesmente absurda, ilógica, e impossível, pois Deus estando fora da realidade da pedra, e como criador dessa realidade, simplesmente não tem qualquer limitação, nem mesmo a de se autolimitar em relação ao mundo exterior, à criação. A autolimitação divina está circunscrita à sua natureza santa e perfeita e à sua vontade. Nada mais pode impedi-lo ou restringi-lo. Nem mesmo a suposta liberdade que o homem diz ter, e que, em algum aspecto, seria limitadora da vontade de Deus. Porque Deus é Deus, e não pode deixar de sê-lo [Dt 4.35; Sl 100.3].

Notas: [1] Textos analisados mais detidamente no áudio da aula, bem como a questão da justiça e bondade divinas.
[2]  Aula realizada na E.B.D. do Tabernáculo Batista Bíblico
[3] Baixe-a em file.MP3

Estudo sobre a Confissão de Fé Batista de 1689 - Aula 33: O poder soberano de Deus - Parte 1




Por Jorge Fernandes Isah


Durante a semana, recebi através do twitter este texto, e como estava preparando esta aula, achei providencial analisá-lo, pois ele trata exatamente do mesmo assunto ao qual daremos continuidade no estudo da C.F.B. Pensei que seria uma boa oportunidade para discutirmos a questão de uma maneira, digamos, mais prática, e uma chance de mudar um pouco o curso de como estamos a estudar.  Será feita a leitura do texto, e os comentários estarão entremeados a ele, em itálico
Então, sem mais delongas, vamos à leitura e análise do texto, o qual é:


Deus pode criar, hipoteticamente, uma pedra que não possa carregar?

O ateu se acomoda no banco da praça, olha sobre o ombro e percebe que há um jovem padre amarrando os sapatos.
- Com licença... O senhor é Padre?
O jovem ergue as sobrancelhas com admiração! [como não reconhecem um clérigo de batina nos dias de hoje?]
- Sim, sou, respondeu o padre ajeitando-se no banco, exibindo o clergyman e um sorriso irônico.
- O senhor ainda crê mesmo? O senhor...
- Sim creio... E o senhor, não crê?...
- Acostumei-me a tolerar a ignorância dos homens...
- Então, temos algo em comum... Revidou o padre, olhando o relógio.

Um minuto... Temos aqui, inicialmente, uma conversa entre o padre e um ateu em um banco de praça. O que se percebe é que o jovem avistou o clérigo e provocou-o com uma questão. Até então, o padre sequer havia notado ou percebido a presença do ateu, mas este percebeu-o e dirigiu-se a ele, inquirindo-o. É importante saber que os nossos inimigos estarão sempre lado a lado conosco, nos tentando. Pedro nos advertiu de que o diabo está ao nosso redor à espreita, buscando a quem possa tragar. Igualmente, os seus servos também querem demover-nos da fé, de forma que reneguemo-la; fruto, primeiramente, do ódio e desprezo a Deus e que se transfere de alguma maneira para nós. 
Uma das formas mais usuais deles é a argumentação sutil, cavilosa, sofismática, de maneira que fiquemos numa posição de dúvida. Devemos, portanto, estar preparados para, onde estivermos, seja no trabalho, na escola, no lar, entre amigos, parentes e vizinhos, e até mesmo dentro da igreja, saber que seremos confrontados por pessoas que são instrumentos do inimigo, e eles próprios inimigos de Deus, para nos tentar. O que o padre está sofrendo é uma tentação. Pode parecer apenas uma conversa trivial, mas ele está sendo tentado pelo ateu. 
Continuemos...

Dobrando o jornal que estampava a figura do último show de rock, troca as pernas numa cruzada e, olhando para o padre, pergunta:
- Como pode crer no que foge à lógica?
- O que não é lógico em crer?
- Muita coisa... Por exemplo: o senhor deve crer que Deus tudo pode...
- Sim, não é só verdade que creio, como é verdade que Ele tudo pode.

Rapidamente o ateu chega ao ponto principal do seu intento: afirmar que a fé não é lógica, a partir de uma pergunta capciosa: Deus tudo pode? 
Sabemos que esta é uma verdade bíblica, e de que ela está presente em uma série de versos, como tais: 
Jó 42.2: “Bem sei eu que tudo podes, e que nenhum dos teus propósitos pode ser impedido” 
Mt 19.26: “E Jesus, olhando para eles, disse-lhes: Aos homens é isso impossível, mas a Deus tudo é possível” [1]. 
Lc 1.37: “Porque para Deus nada é impossível” 
Sl 47.2-3: “Porque o Senhor Altíssimo é tremendo, e Rei grande sobre toda a terra. Ele nos subjugará os povos e as nações debaixo dos nossos pés” 
Sl 97.2-5 - "Nuvens e escuridão estão ao redor dele; justiça e juízo são a base do seu trono. Um fogo vai adiante dele, e abrasa os seus inimigos em redor. Os seus relâmpagos iluminam o mundo; a terra viu e tremeu. Os montes derretem como cera na presença do Senhor, na presença do Senhor de toda a terra" 
Não devemos nunca temer os ataques dos inimigos quando estamos diante da palavra do Senhor. Ela deve ser buscada sempre, consultada nos momentos em que mais temos dúvidas. Eu trouxe este texto pois é uma situação que pode acontecer com qualquer um de nós, e não devemos nos turbar, mas estar preparados, como já disse. Somos questionados o tempo todo em nossa fé, e há uma ação do mundo em fazer-nos parecer tolos ou ultrapassados, ou revelar que a nossa crença é algo insano ou fruto da ignorância. Jamais nos esqueçamos de que a Escritura não tem apenas aspectos doutrinários, mas ela nos orienta a tudo: desde como viver com as demais pessoas até como deve ser o nosso relacionamento com Deus. Ela nos revelará toda a vontade de Deus para a nossa vida, não somente como uma crença mas como a forma correta e santa de se viver, seja em qual tipo de relação estivermos; e assim glorificaremos a Deus em todas as coisas e aspectos, não somente nos momentos em que estamos na igreja.
Nesse Salmo temos descrito o poder de Deus. O salmista se utiliza de uma linguagem poética para descrever o poder absoluto de Deus. Deus reina absoluto sobre todas as coisas. De forma que nada é impossível para Deus, pois ele tem o poder de fazer qualquer coisa. Mais a frente, entenderemos que o poder de Deus é absoluto, mas limitado em alguns aspectos. Fiquem tranquilo, não estou a proferir nenhuma heresia, nem aderi repentinamente à Teologia do Processo ou Relacional, na qual se prega um "Deus" limitado, frágil e titubeante como o homem é... um "Deus" feito à semelhança humana. Não é isso. 
Prossigamos...

-Então, me responda... Deus pode criar, hipoteticamente, uma pedra que não possa carregar?
- Sim. Claro!
O ateu ficou surpreso pela resposta instantânea do sacerdote. E julgando que tivesse sido apressado, tentou explicar a pergunta:
- Mas, veja: Se Deus pode tudo e pode criar algo que não possa erguer, no fim ele não pode tudo, porque não poderá erguer a pedra.

O inimigo lança então o seu o ardil; e penso que devemos ter cuidado com as respostas instantâneas. Ele proferiu uma "pegadinha" com o objetivo de colocar o padre em contradição ou mesmo ridicularizá-lo, de forma que ele se envergonhe da sua fé. Quando estivermos diante de questões que não conhecemos ou de discussões que não passaram por nossa mente, nem foram alvos dos nossos estudos, o melhor a fazer é calar-se, evitando ser imprudente. Está escrito que até o tolo, em silêncio, parece sábio. Se estamos diante de questões que não refletimos, nem cogitamos refletir [e sempre devemos ter em mente que todas as questões devem ser meditadas à luz da Escritura], a nossa resposta deve ser: não sei! Não há pecado em não se saber algo. Muitas vezes, por causa do nosso orgulho, somos tolos o bastante para cair nas armadilhas que nos são postas, como se fosse uma obrigação ter uma resposta para tudo. É necessário saber que não temos, e jamais teremos. O apelo racionalista é de que eles têm, quando não têm. E o fato de não termos, aos olhos deles, nos tornam inferiores, quando reconhecer a nossa limitação é sábio e não o contrário. 
Pedro diz que devemos estar sempre prontos a mostrar a razão da nossa fé. E qual é ela? Ora, o Senhor Jesus Cristo. E isto podemos mostrar e revelar para qualquer pessoa em qualquer situação. Falar que ele nos resgatou, nos livrou da perdição, nos ligou novamente a Deus, que transformou a nossa mente e nos fez novas criaturas, isto podemos falar o tempo todo para qualquer pessoa. Ao invés de darmos atenção para pegadinhas como a proferida pelo ateu, a qual é absurda e não quer dizer nada. O único objetivo dele é confundir e fazer o padre desacreditar a sua fé; e devemos ser prudentes diante de situações como essas. 
Mas o que pensam do fato de a Bíblia dizer que Deus pode criar até mesmo o impossível, pois para ele, nada é impossível? Deus pode criar absurdos? Ou criar algo que não esteja conforme a sua vontade? Não seria a sua vontade o limitador para que Deus crie qualquer coisa? Há limites para Deus?... Sim!
Deus, por exemplo, não mente:
- Nm 23.19: “Deus não é homem, para que minta; nem filho do homem, para que se arrependa; porventura diria ele, e não o faria? Ou falaria, e não o confirmaria?” 
- 1 Sm 15.29: “E também aquele que é a Força de Israel não mente nem se arrepende; porquanto não é um homem para que se arrependa." 
Deus não pode mudar:
- Sl 102.27: “Mas tu és o mesmo e os teus anos nunca terão fim”
- Is 48:12: “Dá-me ouvidos, ó Jacob, e tu, ó Israel, a quem chamei; eu sou o mesmo, eu o primeiro, eu, também, o último”
- Ml 3:6 “Porque eu, o Senhor, não mudo”
- Hb 1:12 ”E como um manto os enrolarás, e como um vestido se mudarão, mas tu és o mesmo, e os teus anos não acabarão”
- Hb 13.8: “Jesus Cristo é o mesmo, ontem, e hoje, e eternamente”
- Tg 1:17 :“Toda a boa dádiva e todo o dom perfeito vêm do alto, descendo do Pai das luzes, em quem não há mudança nem sombra de variação.” 
Então temos que Deus pode fazer tudo, mas ele fará tudo segundo a sua natureza e vontade, de forma que mesmo sendo o Deus do impossível, e devemos entender que isso se refere ao que ele pode fazer como possibilidade, mas não ao que ele pode fazer indo contra a sua natureza, pois tanto a santidade, como a justiça e a perfeição impedem-no de praticar o mal, por exemplo, ou de pecar.
Outro exemplo está em Mt 3.9, em que João o Batista diz, falando aos fariseus: “E não presumais, de vós mesmos, dizendo: temos por pai a Abraão; porque eu vos digo que, mesmo destas pedras, Deus pode suscitar filhos a Abraão”.
É claro que o objetivo principal do profeta era derrubar a arrogância e soberba dos fariseus, comparando-os com as pedras do rio Jordão, mas há nesse verso a verdade de que Deus realmente pode tudo, mas isso não quer dizer que ele fará tudo, pois o fará segundo a sua natureza santa e perfeita, e segundo a sua vontade igualmente santa e perfeita [Is 46.10: "Que anuncio o fim desde o princípio, e desde a antiguidade as coisas que ainda não sucederam; que digo: o meu conselho será firme, e farei toda a minha vontade”].

O ateu ficou surpreso pela resposta instantânea do sacerdote. E julgando que tivesse sido apressado, tentou explicar a pergunta:- Mas, veja: Se Deus pode tudo e pode criar algo que não possa erguer, no fim ele não pode tudo, porque não poderá erguer a pedra.

- O padre se ajeitou no banco novamente e, apoiando os braços sobre as pernas, explicou:
O senhor propõe que Deus faça duas coisas contrárias: criar algo que não possa carregar e, ao mesmo tempo carregá-la. Parece que o senhor ainda não decidiu o que quer que Deus faça... Há um problema na sua pergunta, uma armadilha sofística... Mas, de qualquer modo: Ele pode, sim, fazer ambas as coisas.

Deus não pode tudo? Se ele pode tudo, pode criar qualquer coisa, mas temos de entender que ele fará tudo conforme a sua vontade. Ele não tem de provar nada para nós, muito menos provar-nos o seu poder, pois ele o tem inerente ao seu ser.
Mas a questão é que o ateu propõe uma “pegadinha” e formula algo contraditório: Se Deus pode tudo, pode criar uma pedra incapaz de movê-la; mas se ele não pode movê-la não é onipotente nem todo-poderoso. Ele formulou duas afirmativas que se contradizem, o que é chamado de sofisma, que é um raciocínio falso com a intenção de enganar, ludibriar, de induzir alguém ao erro.
Na verdade, Deus não pode criar uma pedra que não possa carregar, pois ele pode tudo, inclusive carregar algo de massa e peso inimaginável ou mesmo impossível de se carregar por qualquer outro ser, menos ele, que, novamente afirmo, pode tudo, sendo a exceção aquilo que vá contra si mesmo, contra o seu ser perfeito. A característica de um poder absoluto não é fazer tudo o que se pode fazer sem critérios ou juízo. O poder absoluto denota autoridade, e Deus é uma autoridade sábia, perfeita e santa, que não fará sandices, nem agirá ilógica e desproporcionadamente. O poder absoluto de Deus se refere ao fato dele ser o ser supremo sobre tudo e todos, mas também de que ele é absoluto em perfeição e santidade e justiça e sabedoria. Fazer algo insano é impossível para Deus. Fazer algo despropositado, também. Então temos que Deus tem limites sim, circunscritos à sua natureza e vontade, ou seja, aos aspectos intrínsecos do seu ser, pois se assim não fosse, ele iria contra si mesmo...

O ateu franziu a testa, com curiosidade. 
Continuou, então, o padre:
- Deus criou essa pedra. Ela existe... Ou pelo menos existiu:
Quando Jesus ressuscitou Lázaro, está lá nos Evangelhos, Ele ordenou que tirassem a pedra para que Lázaro viesse para fora... Ora, para o senhor, o que é mais fácil? Trazer um morto à vida ou retirar uma pedra?
- Em tese, trazer o morto à vida...

Na próxima aula, continuaremos a meditar sobre este texto.


Notas: [1] Este e outros trechos são analisados mais detidamente no áudio.
[2] Aula realizada no Tabernáculo Batista Bíblico.
[3] Baixe o áudio em file.MP3
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